sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Minhas reflexões sobre o dia do nutricionista

Dia 31 de agosto é comemorado o dia do nutricionista. Todo ano, quando essa data se aproxima, procuro refletir sobre os rumos da minha atuação, meus desafios e minhas recompensas.

Lembro-me até hoje do dia em que, ainda como estudante, me foi plantada a sementinha do que hoje vem a ser o fundamento principal da minha prática: fazer dietas não só não resolve o problema (qualquer que seja ele!) como também é algo nocivo. Isso foi durante meu aprimoramento em transtornos alimentares no Ambulim, onde até hoje tenho o prazer de atuar. Foi nesse curso, inclusive, que tive certeza de que eu queria ser nutricionista e queria ajudar as pessoas a melhorarem sua relação com a comida.

A partir de então (e até hoje), foram incansáveis leituras, cursos e estudo pessoal para de fato construir uma atuação diferente dentro da Nutrição, uma atuação que me fizesse acordar todos os dias satisfeita por estar indo trabalhar. Claro que não foi tão fácil: é cansativo nadar contra a corrente. É delicado atender pessoas que dão tanto valor ao número na balança a ponto de acreditarem que isso determina quem elas são e como devem viver. É difícil, por vezes, lidar com a frustração de que por mais que você se empenhe por um paciente, a chave para a mudança está somente nas mãos dele. Para ser um bom nutricionista, é preciso ainda, na minha opinião, desenvolver e treinar algumas habilidades bastante específicas: escuta ativa, compaixão, paciência, carisma, flexibilidade e empatia. É necessário também saber confiar no próprio feeling, saber captar as mensagens que muitas vezes o paciente não verbaliza – até mesmo por não se dar conta. É preciso manter um certo distanciamento terapêutico, a fim de que as questões dos pacientes não te afetem demais.

Tudo isso dá bastante trabalho...

Mas, para mim, existem muitas recompensas. A gratificação de acordar todos os dias e encontrar sentido em meu trabalho. As devolutivas positivas de cada paciente (que antes me procuravam para “fazer dieta”, e que agora me procuram justamente para nunca mais fazerem uma) e de cada leitor desse blog. Os estudantes e “jovens nutricionistas” que vêm a mim pedindo orientações e ajuda relacionadas à sua atuação. A oportunidade de conhecer pessoas e colegas de profissão maravilhosos, que compartilham da minha visão e com quem muito aprendi (me refiro aqui especialmente aos colegas do Genta).

Tenho orgulho de ser nutricionista porque por meio da minha profissão tenho me tornado uma pessoa melhor, mais humana. Tenho prazer em carregar esse título por ter a certeza de que, por meio dele, é possível ajudar as pessoas a se relacionarem melhor com a comida, e com isso se tornarem mais felizes e saudáveis.

Ao refletir esse ano sobre o dia do nutricionista, percebo que, para mim, o saldo da balança é positivo. E com essa balança eu me importo profundamente.

Feliz dia do nutricionista!

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Melhorando a relação com a comida... Mas só depois de emagrecer.


Não é mistério algum que uma das grandes motivações para se buscar um nutricionista atualmente seja o desejo de emagrecer. Eu sempre explico aos meus pacientes que meu papel não é “emagrecê-los”, e sim ajudá-los a melhorar sua relação com a comida e com o corpo; e que existem muitos outros benefícios quando se tem uma alimentação saudável, benefícios estes desvinculados da perda de peso e exemplificados pelo amigo Cezar Vicente Júnior neste outro post.

Vejam, eu não sou contra o emagrecimento por si só e não sou uma “apologista à obesidade”; só acredito que comer e viver melhor no corpo que temos hoje é o caminho ideal para melhorar nossa qualidade de vida e nossa saúde. Mesmo esse corpo sendo obeso.

Muitas vezes, quando se tira o foco inicial do peso e de fato o indivíduo consegue mudar sua relação com a comida (e consigo mesmo), o emagrecimento é possível. Mas muitas vezes isso também não ocorre. Pelo menos não de imediato. Não posso mentir. E digo isso aos meus pacientes também.

Daí vem a grande pergunta que alguns deles me fazem: então será que eu não posso tentar emagrecer antes (por exemplo, fazendo outra dieta), para me sentir bem, e depois trabalhar minha relação com a comida?

Bom, pela minha experiência, pelos meus estudos e por aquilo que eu acredito, minha resposta é: Não. Não acredito que isso vá funcionar.

Primeiro porque a maioria das pessoas que me procura já fez dietas antes e sabe que todas elas falham. Quando se faz dieta, a relação com a comida torna-se ainda pior. Novamente vai existir a categorização dos alimentos (“bons” e “ruins”) e as regras externas sobre o que e quanto se deve ou não comer. Toda dieta funciona com base na restrição alimentar, e melhorar a relação com a comida implica em permissão alimentar. São conceitos contrários. Quando (e se) a pessoa emagrece fazendo dieta, dificilmente ela vai sentir-se segura para abandonar a restrição voluntariamente e se permitir comer, já que o medo de “botar tudo a perder” e ganhar peso novamente virá com força total.

Além disso, existe o fato de que nada garante que a pessoa vai emagrecer e então ficar satisfeita e feliz, por mais “bizarro” que isso possa soar. Por vezes, a busca pelo emagrecimento camufla outras buscas e anseios em outros domínios da vida do indivíduo. Por isso a terapia se torna por vezes tão essencial: é uma oportunidade de se trabalhar outros aspectos que compõem a autoestima do indivíduo. Como profissionais de saúde, devemos questionar a influência indevida e exagera do peso e forma corporais no nosso senso de valor como indivíduos. Penso que só assim poderemos verdadeiramente ajudar os pacientes que nos procuram.

Claro que alguns pacientes não aceitam bem essa minha resposta e não se convencem de que o caminho que eu proponho possa ser uma alternativa. E eu respeito isso. Não sou a dona da verdade. Mas me mantenho fiel àquilo que acredito. E tenho certeza de que muitos se beneficiam dessa abordagem.