(Este texto foi a resposta da minha paciente à pergunta do título; para entender melhor, leia aqui o último post que escrevi)
"A primeira resposta foi 'em nuvens'.
Nuvens são lindas, de diferentes formas e fluidas.
Formam animais, criaturas que não existem. Daí lembrei que elas são metáfora de
leveza. Pensei que não era uma boa unidade de medida, porque se opunha à ideia
de peso. E o corpo tem peso.
A segunda
resposta foi 'em viagens'.
Fiz também
muitas viagens. Internas e externas. Estive em muitos lugares. Gosto de ser
andarilha, de observar coisas, aprender gírias, hábitos. Meu corpo está junto.
Entretanto,
pensar sobre a resposta fez com que me lembrasse de um episódio bastante triste
de viagem, que mudou muito minha relação com meu namorado. Talvez tenha
quebrado uma coisa aqui por dentro que nem sei se será possível consertar:
Há bastante tempo, ele queria muito que fôssemos
passar uma semana em um resort. De minha parte, tinha pânico profundo desta
ideia – ser obrigada a ficar na piscina de biquíni entre turistas deslumbrantes
e bronzeadas. Parece bastante ridículo. Entretanto, algumas críticas a meu
corpo fora da boa forma, críticas passadas naquela pior forma de recomendação
para a saúde, feitas pelo meu namorado tinham me deixado escaldada. Ele começou
a namorar comigo na minha fase mais gorda. Mas me conhecia há muitos anos,
quando era magra, e por algum motivo isso me encanava demais – achava que ele
lembrava de mim naquela época, sabe? E sei que isso o incomodava também. Sempre
dava alguns conselhos para fazer exercício, esse tipo de coisa.
Bom, a história é que sei que consegui o dissuadir da
ideia de ir a um resort por duas vezes. Mas numa terceira, ouvindo os conselhos
de uma amiga do trabalho, decidi aceitar. Se ele gostava tanto daquilo, vamos
fazer as vontades. Foram medonhas minhas incursões para comprar biquíni. Os
que tinha na gaveta nem me serviam mais, joguei-os fora. Também nas lojas
absolutamente nada servia. Não passavam nem no quadril. Sei que gastei uma
fortuna em dois modelitos só para dizer que tinha conseguido. Arrumei as malas.
Chegamos à noite. Os dois tinham feito uma viagem
extenuante para chegar no resort, cada um vindo de uma cidade diferente. Estava
louca de saudades dele, de vontade de transar e de o apertar, mas não rolou
assim que chegamos – ainda fomos jantar, bebemos muito, daí rolou. Fiquei meio
chateada com isso, com a distância. E estava já bem preocupada com a questão
biquíni. Dormi.
Amanheceu. Era dia de praia. O lugar tinha aquela
beleza indecente. Azuis no mar que eu nunca tinha visto. Poderia morrer ali de
tão bonito. Depois do café da manhã – acordamos tarde – coloquei um dos
biquínis e acho que uma canga, nem me lembro. Vesti Havaianas e passei rímel.
Tenho 'mixed feelings' sobre usar maquiagem na praia, um pouco brega, mas eu
precisava me proteger. Desci. O caminho era longo e tortuoso, com uma vista
deslumbrante para o mar. Adoro o mar. Adoro o sol também.
Cheguei na praia. Escolhi uma cadeira. As turistas
bronzeadas deslumbrantes estavam lá. Seres imortais e tão bonitas. Sílfides.
Era como se eu não encaixasse ali. Bateu um desespero.
Daí vi que havia um bar na praia. Eu tinha uma
pulseira de 'tudo incluído'. Pedi um daiquiri. Achei graça. Se eu fosse
escolher a mulher mais interessante da praia, escolheria a do daiquiri. Comecei
a rir sozinha. Quem não tem siri, caça com daiquiri. Consegui sobreviver aos
outros dias quase bem depois do feito.
Nesta viagem ainda, briguei feio com meu namorado
sobre padrões de beleza. Consegui explicar exatamente o quanto mal me sentia.
Quer dizer, não assim tão bem, porque nem eu sei, mas foi satisfatório. Ele
nunca mais disse nada a respeito. Não que as coisas tenham ficado bem, alguma
coisa quebrou aqui dentro, mas é uma batalha, sabe?
Hoje me dei conta do quão machucada ainda sou por
essa história. Parece bem boba. Parece uma nota de rodapé. Mas é isso. É você achar que não
tem direito a ocupar uma faixa de areia. Não poder entrar numa piscina. Fiquei
pensando uma resposta, que meu corpo poderia ser medido em poemas ou em
histórias. Daí volta a ser algo muito intelectual. O corpo tem peso.
Lembrei ainda que adorava tomar sol na praia. No
quintal. Não tinha a menor vergonha. Talvez hoje tenha que voltar a tomar sol.
Daí decidi a medida: poderia medir meu corpo em raios de sol tomados
durante a vida.
Tem peso, tem velhice, tem prazer. Talvez seja uma
boa unidade de medida.