quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

"Não existe gordinho saudável"... Será?


A reportagem da revista Veja de 11/12/13, entitulada “Não existe gordinho saudável”, foi categórica: é impossível existir pessoas com sobrepeso e obesidade saudáveis. E ponto final. Além de desconsiderar diversos outros estudos que trouxeram evidências contrárias, alguns já citados no blog (veja aqui e aqui), a revista não trouxe uma análise detalhada e crítica do estudo em que se baseou para fazer tal afirmação.

A reportagem coloca que, segundo a meta-análise em questão, pessoas gordas ou magras que apresentam pressão alta, resistência à insulina e colesterol elevado (ou seja, alterações metabólicas) apresentam maior risco de doenças cardiovasculares. Isso já é sabido e esperado. Mas diz ainda que pessoas gordas sem essas alterações de qualquer modo apresentam maior risco que pessoas magras também sem alterações... Simplesmente por serem gordas! A lógica disso é no mínimo duvidosa. Os autores do estudo justificam que esse maior risco seria pelo fato dos marcadores analisados (pressão sanguínea, colesterol) estarem ligeiramente alterados nas pessoas gordas, mesmo ainda estando dentro dos limites aceitados como normais.

Quando se lê o estudo na íntegra, entretanto, algumas coisas são esclarecidas:

1.Pessoas magras com alterações metabólicas apresentam risco de 3,14 de terem algum problema/evento cardiovascular, ou seja, uma chance 214% maior do que pessoas sem alterações metabólicas. Já pessoas gordas com essas alterações apresentam risco de 2,65. Ou seja, o risco de pessoas gordas com alterações metabólicas foi menor do que o risco de pessoas magras com as mesmas alterações!

2.Pessoas magras ou gordas sem alterações metabólicas: o risco de algum evento cardiovascular entre essas pessoas é bem semelhante, sendo que em pessoas com sobrepeso o risco é 1,21 e em pessoas com obesidade o risco é 1,24. Alguns hão de argumentar: ainda assim, 1,21 é maior que 1, ou seja, o risco é maior! Mas mandar a pessoa fazer dieta, o que provavelmente vai levar ao “efeito sanfona”, pode resultar nas alterações metabólicas que levam ao grande aumento do risco independentemente do peso!!!

Ou seja: o grande problema são as alterações metabólicas, quer a pessoa seja magra ou gorda! Mas os autores do estudo (e a revista nacional) optaram por ressaltar somente uma faceta do estudo...

Não estou dizendo aqui que todo gordo é saudável, mas quero deixar explicitado que nem todo magro também o é, apesar da crença popular. O que quero de fato transmitir é que qualquer pessoa tem o potencial de se tornar saudável independentemente de seu peso, contato que se invista em mudanças de comportamentos e de estilo de vida.

E se mesmo assim algumas pessoas quiserem argumentar que é impossível estar gordo e ser saudável, vamos então tentar eliminar fatores que estão claramente contribuindo para piorar a saúde dos obesos, como por exemplo o estigma da obesidade, inclusive entre profissionais de saúde (este assunto já foi tratado no blog, leia aqui).

Este é o último post do ano! Até janeiro e boas festas!

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Como aproveitar melhor as festas de fim de ano


Eu adoro as festas de final de ano. Momento de antecipar as coisas boas que estão por vir no ano seguinte, rever o que aconteceu de importante nesse ano que passou, reencontrar familiares e amigos queridos... E estar na presença da comida. Normalmente bastante comida. Enquanto para alguns isso é tranquilo, para outros pode ser aterrorizante, assim como esse famoso quadro de Edvard Munch.

Para que estas pessoas já possam se preparar, resolvi adiantar este texto com algumas dicas sobre como aproveitar melhor as festas:

1. Pense nas comidas e nos alimentos típicos que mais te geram medo/culpa. De tanto se proibir de comê-los, você pode acabar exagerando. Que tal prepará-los e comê-los nesses dias que ainda faltam para as festas? Assim você reduz o estigma e poderá comê-los com mais tranquilidade na ceia.

2. Pare de pensar no peso que você nem sabe se irá ganhar. É normal comer um pouco a mais durante as festas. Nosso corpo sabe lidar com excessos esporádicos. Se você vier a ganhar um pouco de peso, é bastante provável que o perca quando volta à sua rotina normal, sem precisar se “detoxificar” ou fazer uma dieta para isto.

3. Alimente-se durante os dias 24 e 31/12. Não passe fome o dia todo para poder “caber mais” à noite. Isso vai fazer com que você coma exageradamente e provavelmente mais rápido, sem saborear de verdade a comida. E não era essa a ideia que você tinha em mente quando pensou em fazer isso: seu objetivo era comer mais, mas para aproveitar o que você iria comer.

4. No momento da ceia, observe todos os pratos disponíveis e escolha aquilo que de fato você quer comer. Você não precisa pegar nada que não queira para agradar ninguém. Agrade a si mesmo: monte um prato com as coisas que mais gosta, que normalmente são aquelas que possuem algum significado ou memória alimentar: a farofa fofinha da sua avó, o peru que sua mãe só faz nessa época do ano...; sente-se num local relativamente tranquilo; coma devagar e com prazer.

5. Avalie algumas vezes seu grau de saciedade. Se havia algo que você queria comer mas já está um pouco cheio, não se preocupe: você pode pegar um pouco e guardar para o dia seguinte. Perceba se está pegando a terceira sobremesa porque de verdade a quer ou se já está cedendo ao pensamento “já que”: “já que comi tudo isso, que mal faz um pouco mais...”

6. A comida é parte importante das festas, mas existem outras coisas além dela. Perceba que as celebrações de fim de ano não se resumem só à comida: monte uma decoração bacana na sua casa, compre uma bela toalha de mesa para a ceia, monte suia lista de metas para 2014 e pense em incluir nela uma meta para melhorar seu autocuidado: começar uma nova atividade física prazerosa, fazer um curso, comer uma fruta todo dia, fazer massagem uma vez ao mês...

Vou adorar ouvir outras sugestões bacanas!

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Por que a liberdade alimentar parece assustadora


Fico muito feliz de divulgar que a reportagem de capa da revista Vida Simples de dezembro, da qual eu participei, tem como título a frase “chega de dieta”. Ou seja, enquanto muitas revistas neste próximo mês estarão tratando das “comilanças” das festas de fim de ano e o que fazer depois para “compensar/detoxificar/emagrecer” (e sem dúvida surtar!), uma revista de grande circulação decidiu nadar contra a corrente. Palmas pra ela.

Mas resolvi escrever aqui sobre por que a ideia de fazer uma dieta pode ser confortante para algumas pessoas. Ou porque a liberdade alimentar pode parecer assustadora.
Em primeiro lugar, a indústria das dietas é uma das mais rentáveis do planeta: os últimos dados que pesquisei colocam sua lucratividade na casa dos seis bilhões de dólares ao ano. Ou seja, tem muita gente investindo para que a prática de dietas pareça algo funcional, esperançoso, ou mesmo glamourizado. Conversar sobre a mais nova dieta ou modismo alimentar te coloca dentro de um círculo social e dos tópicos das rodas de conversa. Assim como assistir a novela das oito (que agora é das nove...).

Em segundo lugar, fazer dieta pode trazer uma falsa noção de controle, já que ficar atento e obediente às regras alimentares impostas pela dieta dá a sensação de que uma parte da nossa vida caótica está “sob controle”.

Em terceiro lugar, as pessoas confundem “não fazer dieta” com “ser indulgente”, ou seja, comer o que quiser sempre que quiser. Não é bem assim... Liberdade alimentar implica em fazer escolhas, analisar o porquê de certas escolhas e responsabilizar-se por elas. Pra alguns, a proibição parece um caminho mais fácil, pois dessa forma não se pode comer e ponto final. Não é necessário fazer uma escolha, alguém já fez pra você.

Liberdade alimentar é saber que, moralmente, uma fatia de bolo de chocolate tem o mesmo valor e importância que uma maçã. Mas você não pode comer só maçã. Ou só bolo de chocolate...

Por fim, liberdade alimentar implica em autoconhecimento, em perceber suas sensações corporais de apetite, fome e saciedade. Implica em conhecer e entender o que de fato faz bem ao seu corpo, quais as sensações experimentadas depois de comer os diversos tipos de alimentos. Implica em reconhecer as “verdades alimentares” de cada um. Eu por exemplo, preciso comer algo sólido pela manhã, se não passo fome o dia todo; eu amo pastel, mas sei que não posso trocar um almoço por ele ou ficarei lentificada a tarde inteira.

Por isso, não me venha com iogurte e chia no café da manhã! E sei que é melhor pra mim passar reto pela feira na hora do almoço. Mas ter a liberdade de comer um pastel no happy hour do final do dia é fabuloso.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Cirurgia bariátrica aumenta risco de bebês prematuros

Já atendi algumas mulheres obesas cuja principal motivação para passar pela cirurgia bariátrica era o desejo de ter filhos. Sim, existem riscos associados à gestação quando a mulher é obesa (veja aqui), apesar de que existem pesquisas que indiquem que esses riscos não dependem só do peso inicial da gestante e sim do quanto ela ganha durante a gestação e de sua condição metabólica (ou seja, uma mulher magra que ganhe muito peso durante a gravidez pode ter um risco maior de complicações do que uma obesa metabolicamente controlada; vejam esse blog sobre os mitos da gestação na obesidade).

Neste sentido, estas mulheres que consideram a cirurgia como opção devem estar cientes dos riscos gestacionais que também existem após o procedimento. Um estudo de coorte recente analisou mais de um milhão de partos ocorridos na Suécia entre 1992 e 2009. As mães foram divididas em grupos: aquelas que haviam passado por cirurgia de obesidade (há uma média de cinco anos antes do parto), aquelas que não haviam passado e aquelas com IMC maior que 35 ou 40kg/m² (ou seja, que foram gestantes obesas). Diversos fatores que poderiam influenciar nos resultados do estudo foram controlados: IMC pré-gestacional, presença de tabagismo, idade materna, nível educacional.

Os resultados indicaram que gestantes pós-bariátricas apresentaram maior risco de nascimento pré-termo, ou seja, antes da 37a semana, e maior risco de terem bebês pequenos para a idade gestacional, mesmo comparando com gestantes obesas. Ou seja: neste estudo, as gestantes obesas apresentaram menores riscos que as gestantes pós-bariátricas, grifar! (para nascimentos pré-termo e bebês pequenos para a idade gestacional). Os autores sugerem que grávidas que já passaram pela cirurgia sejam consideradas no pré-natal como um grupo de risco, mesmo apresentando IMC eutrófico (IMC “normal”). Estes dados são evidências importantes que devem ser analisados durante a tomada de decisão para a cirurgia bariátrica.

Bom final de semana a todos!

sábado, 9 de novembro de 2013

Completamente transformado, mas ainda igual


Já são bem divulgados e reconhecidos os efeitos benéficos da cirurgia bariátrica a curto e médio prazo, especialmente para pacientes que de fato possuem indicação para o procedimento e que são bem acompanhados durante todo o processo: perda e manutenção do peso perdido (apesar de que existem estudo que mostram que até 40% dos pacientes não atingem a meta de peso esperada a longo prazo); aumento do bem-estar geral; melhoras na saúde física. Entretanto, aspectos que na minha opinião não são suficientemente abordados com os pacientes antes e após a cirurgia são as dificuldades em lidar com as grandes transformações físicas e psíquicas resultantes do procedimento, principalmente a longo prazo (mais de cinco, dez anos). Citando alguns exemplos:

- muitos pacientes consideram a rápida mudança de imagem corporal algo difícil de se compreender, muitos se sentem vulneráveis e podem enfrentar situações negativas nos relacionamentos com família e amigos
- o reganho de peso, que até certo ponto é normal e esperado, pode ser visto como frustrante, vergonhoso e traumático
- o papel da comida na vida dos pacientes muda muito, e alguns podem sentir falta do conforto emocional que ela proporcionava, buscando então por outras formas inadequadas de lidar com sensações desagradáveis (abuso de álcool e drogas, por exemplo)

Um estudo qualitativo recente, com pacientes noruegueses que passaram pela cirurgia há pelo menos cinco anos, avaliou o significado do procedimento em suas vidas, focando nas transformações de peso, nas relações sociais e nas experiências corporais vivenciadas por eles. Alguns achados são bastante interessantes:

- os pacientes lidavam com o corpo de uma forma ambivalente: ao mesmo tempo que reconheciam todos os benefícios conquistados, percebiam que parte do desconforto com o corpo ainda persistia, apesar do emagrecimento (leia este post que trata sobre isso);
- o conforto de ter uma saciedade precoce, que promoveu aos pacientes uma maior sensação de controle, por vezes dava espaço à uma sensação de perda e vazio: o desejo pela comida e por sentir um pouco mais do sabor, mesmo sabendo não ser possível, impedia uma completa satisfação ao comer;
- a cirurgia foi encarada como “uma segunda chance para viver”, mas o “fantasma” do reganho de peso continuava pairando sobre os entrevistados, que relatavam uma dificuldade cada vez maior em manter o controle dos hábitos alimentares (a fome aumentou com o passar dos anos, as vontades começaram a surgir, e muitos não sabiam com encarar isto);
- alguns pacientes apresentaram após a cirurgia doenças crônicas como câncer e distúrbios cardiovasculares, e sentiram-se assustados pois foram forçados a encarar as limitações de um corpo magro, porém não invencível;
- alguns pacientes, que quando obesos se sentiam invisíveis e imperceptíveis, sentiram dificuldades em lidar com o novo grau de atenção alheia após a cirurgia, bem como com os comentários invasivos sobre sua alimentação e seus corpos.

Claro, o estudo foi realizado na Noruega, uma realidade bem diferente da nossa, e as transformações vivenciadas por cada pessoas são bem diferentes. Acompanho muitos pacientes que se beneficiaram imensamente da cirurgia. Entretanto, também sei que existem pacientes que passam pelas limitações e dificuldades descritas acima, e acho que aqueles que consideram passar pela cirurgia devem estar cientes disto. Nada na vida traz só coisas boas. Acredito que este estudo ilumina muitas questões a serem consideradas na avaliação, preparo e acompanhamento a longo prazo dos pacientes cirúrgicos.

Bom final de semana!

sábado, 2 de novembro de 2013

Como aceitar meu corpo se eu fico mais bonito/a mais magro/a?


Está é uma pergunta que costumo escutar bastante no consultório, quando tento trabalhar autoaceitação como forma de melhorar o autocuidado. Vamos refletir sobre como aceitar mais o corpo:

1. Desafie suas crenças: isto de fato é verdade?

As pessoas/mídia repetem tantas vezes que magreza = beleza que muitas vezes nós não desafiamos este “senso-comum”. Você de fato acredita que fica mais bonito/a mais magro/a? Ou será que seu olhar está tão viciado naquilo que você gostaria que seu corpo fosse (de forma a se encaixar no padrão do que é belo) que não consegue enxergar as belezas (mesmo que sutis) de seu próprio corpo?

A beleza depende do olhar de quem vê e, portanto, do seu julgamento sobre aquilo que vê. Aceitar seu corpo depende de uma atitude positiva que tem que partir de si próprio. Esteja aberto para buscar recursos que valorizem outros tipos de beleza, que valorizem a beleza presente na diversidade de corpos existentes:

- Busque fotos de modelos plus-size
- Veja os sites de movimentos como “The Body Positive” e “The Body Project
- Compre roupas novas que façam você se sentir bem; afinal, é impossível aceitar seu corpo com algo extremamente apertado te incomodando
- Conscientize-se sobre a manipulação das imagens divulgadas pela mídia: lembre-se que por trás das imagens existem maquiadores, cabeleireiros, luzes artificiais colocadas no lugar certo, Photoshop...

2. Pare de se vitimizar

Pare de acreditar que seu corpo é a única coisa “errada” em sua vida atualmente. Pense:

- no que você pode fazer hoje, independentemente de seu peso, para trazer mais sentido à sua existência
- em como buscar realização pessoal sem ser por meio do emagrecimento

Reveja suas vontades e sonhos e saia em busca deles agora. Você não precisa esperar o “corpo ideal” para começar a viver sua vida.

3. Acredite na importância da aceitação corporal para seu bem-estar (e, quem sabe, emagrecimento)

Gostar um pouco mais do seu corpo pode catalisar mudanças duradouras nos hábitos de saúde. Quem se gosta se cuida melhor, pois de fato se sente merecedor de cuidado. Não conheço nenhum estudo que diga que quem se odeia emagrece mais ou tem uma saúde melhor. Mas conheço estudos que dizem o contrário.

Bom final de semana a todos!

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Halloween horripilante

E mais uma vez os Estados Unidos – um dos países que mais sofrem com a incidência de transtornos alimentares – se superaram. Negativamente.

Uma empresa ironicamente chamada de “Dreamgirls” (que pode ser traduzido por “Garotas dos sonhos”) está vendendo para este Halloween (31/10) uma fantasia chamada “Anna Rexia”, termo que faz alusão à anorexia nervosa. Ela vem com uma fita métrica enrolada na cintura e uma “medalhinha de honra”.


Senso de humor para alguns, desejo de consumo para outros (ou outras, já que só existe a versão feminina da fantasia, graças a Deus!)... Para mim, soa mais como absurdo. Acho que não sou só eu que acredita que esse tipo de fantasia pode gerar um impacto negativo na cabeça de algumas crianças e jovens, que podem ver a doença como algo “glamouroso” ou mesmo banal. Até porque essa fantasia foi colocada no mercado em 2011 e depois de uma petição online as vendas foram descontinuadas... Até agora.

“Que exagero!”, alguns vão dizer. Mas quem trabalha com transtornos alimentares sabe que não podemos arriscar, nem mesmo um pouco. E quem conhece sabe que os fatores que predispõem e precipitam um transtorno alimentar podem ser muito sutis. Como uma simples fantasia de Halloween...

sábado, 19 de outubro de 2013

Se Dê Conta 2013: Semana de Conscientização Sobre Transtornos Alimentares e Obesidade

Como alguns leitores já sabem, eu faço parte do Genta – Grupo Especializado em Nutrição e Transtornos Alimentares. Somos nutricionistas (e temos a honra de contar com a participação de uma educadora física no grupo!) que estudam e trabalham com transtornos alimentares e que questionam os padrões de beleza e a definição do que é de fato uma alimentação saudável.

Todo ano, organizamos o “Se Dê Conta: Semana de Conscientização Sobre Transtornos Alimentares e Obesidade”, que é um período no qual nos mobilizamos para de alguma forma alertar o público sobre a seriedade dos transtornos alimentares e sobre e os fatores que contribuem para o surgimento e manutenção dessas doenças, como por exemplo a propagação e internalização de ideais de beleza e alimentação.

No “Se Dê Conta 2013”, a ideia é usar as redes sociais (Facebook do Genta e Instagram @sedeconta) para postar imagens contestadoras sobre imagem corporal, padrão de beleza e alimentação saudável. Vejam o cartaz de chamada:


Nesta semana que passou, nós, integrantes do Genta, divulgamos as nossas próprias fotos para “servirem de exemplo”. Eu resolvi tirar foto da minha barriga (parte do meu corpo que eu não gosto tanto) com a palavra “herança” escrita nela. Sim, porque afinal ela é igual a da minha mãe (que também saiu em uma das fotos)! E reconhecer isso melhorou a relação que eu tenho com meu corpo e minha barriga.



E abaixo estão algumas outras fotos que já foram divulgadas na página do Genta no Facebook:


E vocês, o que estão esperando?? Tirem já suas fotos e mandem pra nós!!! As instruções estão no cartaz.

Participem conosco dessa “revolução”!!!

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

"Do que eu mais sinto falta de quando eu era gorda"


Bom dia pessoal!

Essa semana resolvi postar uma tradução livre feita por mim de um texto publicado na Marie Claire americana em julho de 2012, escrito pela jornalista Sarah Elizabeth Richards. Ele conta do que ela sentiu falta em seu corpo - e em sua vida - depois que emagreceu quase 20kg. Afinal, emagrecer não é tão simples assim e não necessariamente traz só coisas boas no processo...

Aproveitem!

"Do que eu mais sinto falta de quando era gorda..."

"Eu estava em pé no bar, segurando minha margarita de manga, enquanto minhas duas amigas estavam conversando com dois caras. Senti que estava 'sobrando' e tentei fazer contato visual com um cara muito fofo perto da porta. Ele me ignorou.

'Fique mais um pouco', disse a mim mesma. 'Você só está aqui há uma hora'.

Não foi assim que eu imaginei meu gran debut. Tinha acabado de terminar um relacionamento de longos anos, e minhas amigas insistiram que eu deveria passar a noite com elas num bar cheio de homens desejáveis.

Recentemente eu havia perdido 18 quilos (aumentando meu consumo de vegetais e grãos integrais e reduzindo a ingestão de açúcar, massas e pães). Segui o conselho de minhas amigas de usar roupas que mostrassem mais o meu corpo e lá estava eu no bar, sentindo-me inadequada.

O ar condicionado estava no máximo, e eu senti o ar gelado em cada pedacinho na minha pele exposta – meus braços, minhas pernas, meu decote. Mas ao invés de me sentir sexy, eu me senti pelada.

'Estou realmente cansada', disse a minhas amigas. 'Estou indo'.

Ao chegar em casa, abri meu guarda roupa e achei minhas antigas roupas de quando era gorda. Enterrei meu rosto no que costumava ser minha camiseta preferida e senti o cheiro de um antigo perfume. Eu a vesti, minha ansiedade me dominando. Me senti eu mesma novamente.

De vez em quando, eu sentia falta de ser gorda.

As pessoas vivem falando sobre os benefícios da perda de peso, mas não se fala muito sobre o choque que é emagrecer. Quando você decide emagrecer, você só pensa nas coisas boas: novo corpo, saúde melhorada (e, se você se engaja em pensamentos milagrosos, uma nova vida). Ninguém te alerta sobre o outro lado.

Fisicamente, eu sentia frio o tempo todo, bem como uma dorzinha palpitante do lado esquerdo das minhas costelas – a sensação que sinto sempre que estou vulnerável. Emocionalmente, eu não me sentia preparada para lidar com todas as mudanças, e não podia mais usar a comida para me acolher.

E então veio o desapontamento. Nas minhas fantasias, eu parecia mais confiante e mais bem vestida. Eu tinha mais amigos e namorados. Eu me tornava uma melhor profissional. Quando eu era gorda, essas fantasias ficavam armazenadas em segurança, na ideia de que “um dia” isso se tornaria realidade. Na minha cabeça, eu não cogitava ter que descobrir o limite dos meus talentos, encarar meus medos de intimidade, ou mesmo confrontar o quão esquisita me sinto ao conhecer novas pessoas.

Quando eu perdi peso, eu tomei um banho de realidade. Eu continuava sendo eu mesma, com os mesmos problemas. Eu só estava menor.

E a minha versão menor não necessariamente se tornou uma versão melhor – pelo menos não no início. Eu adorei ver as novas curvas de meu corpo, mas nunca me imaginei nua em frente ao espelho, pegando nas mãos a pele solta debaixo dos meus braços e na parte interna das minhas coxas. Ou que eu veria meus seios ficarem mais flácidos, e meu bumbum ficar ainda mais caído. Eu me sentia uma estranha em meu próprio corpo.

Havia também as questões do dia a dia. Os experts em dieta não te contam o quão desconfortável você se sente no início por não poder mais comer o quanto você comia antes. Ou como quase todas as interações sociais incluem referências sobre seu novo corpo. No começo é legal ouvir “uau, como você está linda!”, mas depois isso se torna angustiante, pressionador. Tinha momentos em que eu simplesmente não queria toda a atenção voltada para mim. Eu só queria o conforto do grupo.

Não estou dizendo que quero de volta minha gordura. Eu trabalhei duro para perder todo o peso extra que ganhei na faculdade porque me afundei em lasanha e comida delivery para conseguir lidar com toda minha carga de trabalho. Hoje, peso 63kg, um peso que tenho mantido há quatro anos. Levei quase sete anos para atingi-lo. Para mim, essa foi a velocidade ideal, pois me permitiu lidar aos poucos com as novas questões que foram surgindo. Além disso, deu tempo para que minha pele (inicialmente flácida) se acomodasse novamente (com ajuda da ioga e do kickboxing, dois exercícios que adoro). Perder os últimos sete quilos levou quase três anos. Parecia que eu não estava mais levando tão a sério meu status de 'quase magra'.

Eu gostaria de dizer que eu aprendi a me sentir melhor com meu corpo naturalmente, por meio de um processo orgânico de celebrar meus pontos fortes e aceitar minhas falhas. Ao invés disso, eu me forcei a me sentir bem, como se estivesse entrando aos poucos em uma piscina gelada.

Eu ainda luto com a sensação de parecer nua às vezes, mas isso não mais me deixa ansiosa. Nas raras ocasiões em que parece que não vou aguentar, eu me enrolo num grande robe de cetim até passar (sim, eu me livrei das minhas roupas de quando era gorda).

Então, eu ponho minhas novas calças de ioga, que abraçam minhas novas curvas.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

A verdade sobre permissão alimentar


Já escrevi alguns posts que falavam sobre permissão alimentar (aqui e aqui), mas decidi dedicar um post inteiro a este tema pois acho que ele é de extrema importância para quem quer adotar uma alimentação saudável e ser feliz.

Basicamente, permissão alimentar é poder comer o que quer que seja que você goste e tenha vontade no momento em que você tem vontade. Simples assim.

Permissão alimentar não é comer um pedaço de bolo só em aniversários e no final de semana porque você considera tais ocasiões como “politicamente corretas”.

Permissão alimentar é poder comer dois pedaços daquele bolo delicioso de vez em quando só porque está muito bom. E assumir que às vezes é melhor deixar o segundo pedaço pro dia seguinte porque já se está satisfeito. E você sabe que de fato poderá comê-lo amanhã.

Permissão alimentar não é sinônimo de “autoindulgência” ou de “ligar o fod*-se”, como alguns gostam de colocar. Mesmo que nesses momentos você de fato coma o que estava com vontade, e coma até mesmo em excesso. Porque provavelmente você vai comer desejando não ter comido. E vai se massacrar por isso.

Quando há permissão alimentar não existe espaço para culpa, arrependimento e “auto-bullying”. Portanto, se você vai comer dizendo que vai “fazer uma gordice”, você não está se permitindo de fato. Você está moralizando a comida e assumindo que só quem é gordo pode comer determinados alimentos (sugiro a leitura do texto da Nina Lemos na edição deste mês da revista TPM).

Permissão alimentar previne exageros alimentares (por mais que isso pareça paradoxal).

Permissão alimentar requer coragem, autoconhecimento e trabalho ativo.

Permissão alimentar faz parte do seu autocuidado.

Permissão alimentar, a meu ver, é um conceito básico de qualquer programa de reeducação alimentar eficaz e duradouro.

E vocês, o que pensam?

Bom final de semana a todos!

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Mecanismo de saciedade em obesos pode estar comprometido

Um estudo recente da Universidade de Adelaide (Austrália) verificou em laboratório o impacto de uma dieta rica em gordura na capacidade do nosso estômago sinalizar ao nosso cérebro que já podemos ficar satisfeitos. O que se percebeu foi o seguinte: em ratos obesos por consumirem uma dieta rica em gordura, os neurônios que fazem essa sinalização ficam menos sensíveis, e esse efeito permanece mesmo após os ratos perderem peso. Ou seja: pessoas obesas que mantiveram uma alimentação rica em gordura por longos períodos e perderam peso após uma dieta podem voltar a ganhar peso por conta dessa alteração no mecanismo de saciedade, já que vai demorar mais para ficarem satisfeitas.

Mais uma evidência de que a história de que “só é gordo quem quer” não tem fundamento científico...

domingo, 8 de setembro de 2013

O mito do não merecimento


“Eu não mereço comer esse bolo pois sou moreno”.

Você já ouviu alguém dizer isso? Pois é, eu também não. Pois não faz sentido algum! O que tem a ver a pessoa ser de uma determinada maneira e comer ou não um pedaço de bolo?
Mas quando se trata de pessoas gordas, usamos esse raciocínio. É comum o pensamento, inclusive por parte de pessoas gordas, que elas não podem:

- comer doces
- comer frituras
- comer o que quer que seja que tenham vontade, exceto se for alface
- usar roupas curtas
- usar roupas justas
- usar biquíni
- sentir-se atraentes
- etc etc etc

Algumas questões para reflexão:

- Da onde veio a ideia de que o indivíduo deve ter um corpo x ou y para MERECER comer ou se vestir da maneira como deseja? Será que só os magros tem liberdade de escolha?
- E se a pessoa não emagrecer nunca, ele terá sua liberdade cerceada para sempre?
- O que temos a ver com a escolha alheia, a não ser que nossa opinião seja solicitada diretamente?
- O pior de tudo: e se a pessoa emagrecer e se dar conta de que sua autoestima e seu senso de valor próprio continuam baixos, e ela continuar não se achando digna? Pois eu já vi isso acontecer diversas vezes.

Eu acredito que temos que nos respeitar e nos sentir merecedores de cuidado, não importando nosso tamanho corporal.

Eu acredito que temos que assumir nossas vontades.

Eu acredito que temos que valorizar mais o agora. Pois de fato é só ele que nós temos.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Dieta que funciona é aquela que vende


Este final de semana (31/8) foi dia do nutricionista! Que alegria! Me sinto muito feliz por ter escolhido uma profissão que gosto muito e por meio dela poder ajudar as pessoas a terem uma relação melhor com a comida. Inclusive, fui comemorar comendo um Big Mac: fazia muito tempo que não comia, e era “Mc Dia Feliz”, aproveitei para ajudar as crianças com câncer!

Mas como nem tudo é comemoração, vamos aproveitar para refletir um pouco. Saiu na semana passada o resultado da pesquisa Vigitel 2012 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), que mostrou que mais da metade da população adulta brasileira (51%) está com excesso de peso. Em 2006, a taxa era de 43%.

Por que isso está acontecendo? Existe uma série de fatores envolvidos, mas um dos motivos, na minha opinião, é óbvio: estamos falhando com nossos pacientes. Continuamos usando a mesma estratégia de sempre (dieta) para lidar com o fato da população estar comendo mais e pior.

Mas se as dietas de fato funcionassem, essa porcentagem não estaria aumentando. Dietas acabam com o metabolismo. Dietas pioram a relação da pessoa com seu corpo e com a comida. Dietas aumentam a probabilidade da pessoa comer em resposta às emoções. Dietas aumentam muito o risco de desenvolver transtornos alimentares. O ciclo das dietas é algo que ocorre com 99% dos indivíduos, levando ao famoso “efeito sanfona”.


Então vamos para a segunda pergunta: por que muitas pessoas continuam apostando nas dietas? Porque o mercado das dietas é extremamente lucrativo e movimenta mais de 6 bilhões de dólares ao ano em todo o mundo. Ele é extremamente competente em promover insatisfação para depois poder vender a “solução”: são inúmeros os livros, revistas, pílulas, suplementos, equipamentos de ginástica, cintas, programas de dieta, shakes...

Pois digo aqui que sou nutricionista e não acredito em dietas. Não prescrevo dietas. Trabalho verdadeiramente com reeducação alimentar. Sou como um salmão nadando contra a corrente, mas o que me dá forças é a certeza de estar bem acompanhada pelos meus colegas do GENTA (Grupo Especializado em Nutrição e Transtornos Alimentares) e pelos meus pacientes, que acreditam num trabalho diferente pois já sofreram demais com as inúmeras consequências negativas das dietas. E toparam me acompanhar num caminho diferente, que promove aceitação corporal, autonomia alimentar e autoconhecimento. É um caminho mais difícil, porém duradouro.

Para terminar, um texto de uma americana que trabalhou anos a favor da indústria das dietas. E pede desculpas por isso.

Boa semana a todos!

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

“Querido, você está ótimo assim...”


“Mas quando perder peso ficará melhor ainda.”

Isso foi o que ouvi da esposa de um paciente que estava em acompanhamento para cirurgia bariátrica. Apesar de desrespeitoso e absurdo, esse tipo de “encorajamento” para que o parceiro/a emagreça e faça dieta é muito comum. Os comentários podem até ser bem-intencionados, mas como diz o ditado, de boas intenções o inferno está cheio.

Digo isso porque uma pesquisa recente da Universidade de Minnesota com 1300 jovens em relacionamentos amorosos (20 a 31 anos) encontrou que 40% deles havia se engajado em comportamentos extremos de dieta no último ano, e a presença de compulsão alimentar dentre as mulheres que foram encorajadas a fazer dieta era duas vezes maior que nas demais mulheres. Em relação aos homens, a presença de compulsão naqueles incentivados a fazerem dieta foi três vezes maior. E o pior: metade dos homens e mulheres apresentavam peso normal ou baixo peso, e ainda assim metade relatou que seu parceiro/a incentivava a prática de dietas.

Por que a presença de compulsão é maior naqueles incentivados a fazerem dieta? Uma das razões é bastante simples: comentários negativos sobre peso vindos de uma pessoa importante e amada tendem a aumentar a ansiedade com o corpo e a comida, contribuindo para uma pior imagem corporal e autoestima, além de incentivas atitudes alimentares inadequadas.

Quer ajudar seu parceiro/a? Então, incentive os cuidados com a saúde, sem focar no peso. Convide-o/a para fazer uma caminhada com você. Melhore seu hábito alimentar. Talvez ele ou ela siga seu exemplo.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

"Se eu fosse ouvir todas as minhas vontades..."


Semana passada, eu escrevi sobre ouvirmos mais o nosso corpo e as nossas vontades. O que para mim faz todo o sentido: nosso corpo é tão inteligente que ele nos diz exatamente quando devemos comer (por meio dos sinais de fome) e o que queremos comer (por meio do nosso apetite e das nossas vontades). Entretanto, recebi alguns comentários ao texto dizendo mais ou menos o seguinte: “se eu fosse ouvir todas as minhas vontades... o que seria de mim?!”

Daí eu percebi que não me expressei muito bem. O que eu de verdade quero dizer é: nosso corpo é muito inteligente e nos diz quando devemos comer e o que queremos comer, contanto que:

1. Eu cuide bem do meu corpo e me permita conectar-se com ele. Isso envolve:
- não fazer dietas/restrições sem sentido
- comer quando sentir fome e parar quando estiver satisfeito, aceitando que comer um pouco a mais de vez em quando porque a comida está muito gostosa é perfeitamente aceitável
- experimentar alimentos sempre que possível para expandir os gostos alimentares
- dormir bem (a produção dos hormônios de fome e saciedade sofrem interferência do nosso padrão de sono!)
- manejar o estresse (o cortisol, hormônio do estresse, aumenta nossa fome)
- acordar cedo para fazer um exercício físico prazeroso, se esse é o único horário disponível, mas aceitar dormir de vem em quando até mais tarde porque se está muito cansado
- respeitar o corpo e suas limitações, enxergando que talvez ele não seja aquilo que se deseja, mas que ainda assim possui muitas qualidades e potenciais

2. Eu assuma uma postura neutra diante dos alimentos. Essa parte hoje em dia é mais difícil. As pessoas acham que se comerem tudo o que têm vontade vão perder o controle, escolher sempre os alimentos “proibidos”. Mas isso só vai acontecer se de fato existirem alimentos “proibidos”! Se você assumir que é ok comer chocolate, sem sentir culpa, acredite: você não vai sentir vontade de comer chocolate sem parar, todos os dias, a todo momento. Mas para isso você de fato precisa neutralizar o chocolate em sua vida.

Que tal agora trabalharmos todos esses aspectos?

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

“Escolhas inteligentes”... Será?


É comum esbarrar com esse tipo de figura por aí. Algumas delas de fato trazem opções interessantes e mostram que calorias não definem qualidade alimentar. Mas o grande problema delas, na minha opinião, é assumir que as escolhas são de fato iguais. Que comer um sanduíche de espinafre quando se está com vontade de comer um de mortadela dá na mesma.

Vou ilustrar com uma história verídica.

Saindo do consultório semana passada, resolvi passar na Kopenhagen pra tomar o famoso capuccino da loja. Já no caminho, estava antecipando o prazer que seria tomar algo quente e gostoso naquele final de tarde frio. Ao entrar, só havia eu e mais duas clientes, sentadas juntas. Uma delas pediu um café com leite grande, despejou dois saquinhos de adoçante e não parava de olhar meu capuccino, enquanto discutia com sua colega sobre o novo peeling que faria semana seguinte: será que vou ficar bonita mesmo, será que vou descascar muito, poderei usar base ou a pele ficará irritada, etc.

E ela era linda. De verdade. Pelo menos na minha opinião.

Acabamos nos dirigindo juntas ao caixa e a vendedora ofereceu a ela uma barrinha de chocolate ao leite que estava na promoção. A moça olhou para a amiga, como se buscando aprovação, e com um suspiro acabou aceitando.

Na minha cabeça, supus que desde o início a garota gostaria de ter escolhido o capuccino, mas tentou se satisfazer com o café com leite e adoçante. No fim das contas, acabou comendo o chocolate.

Ela tentou fazer uma “escolha inteligente”. Mas será mesmo? Será que conseguimos burlar nossas vontades ou elas dão um jeito de nos pegar desprevenidos depois?

Que tal ouvirmos mais o nosso corpo?

Uma boa semana a todos!

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Nuvem negra num céu azul


É comum receber “super-pacientes” em meu consultório. E aqui me refiro especialmente a mulheres que trabalham longas horas, cuidam de casa e dos filhos, cozinham para o marido e que precisam estar em dia com seu autocuidado: fazendo exercício regular, comendo direito todos os dias e, claro... “Precisam” ser magras.

O fato é que é impossível fazer tudo isso de forma impecável, sem deixar a peteca cair em uma dessas áreas da vida. Essas mulheres assumem que é possível “ter tudo” e não precisar fazer escolhas, definir prioridades. E isso não é diferente com a alimentação: elas chegam ávidas por um “cardápio”, uma lista do que comer e do que não comer.

A questão é que essa escolha não cabe a mim. A liberdade de escolha é individual. Eu posso sim sugerir opções, mas dentro de um contexto, uma situação. Pra mim é muito mais válido entender quando, como e por que a pessoa está comendo do que simplesmente o que.

Se você tem a sensação de que está sempre em dívida com você mesma, cuidado: esse tipo de pensamento é como uma nuvem negra que a impede de enxergar o céu azul.

Tente pensar nas coisas boas que você tem e que já conquistou, graças às suas competências e valores pessoais. Avalie como aquilo que já está bom em sua vida pode te aproximar do que ainda falta conseguir.

Seja flexível. Ou seja: se quiser, faça pilates três vezes na semana, mas não se cobre excessivamente ou se critique caso escolha faltar às vezes porque ficou até tarde na festa da noite anterior; coma salada de chia (se gostar), mas quando for à lanchonete de vez em quando permita-se pedir um cheese bacon com milk shake; guarde dinheiro para fazer botox se você acha que com isso ficará mais bonita, mas reflita se não é melhor usar esse dinheiro para fazer uma viagem nas férias e relaxar.


domingo, 28 de julho de 2013

Deixem Kate em paz!

Esta semana fiquei indignada com um comentário que li no Facebook, que dizia mais ou menos assim:

"Nossa, já faz quatro dias que a princesa (Kate Middleton) teve o nenê e ela ainda está gordinha??" (em referência à foto abaixo)


Indignação número 1: a mulher tem uma gestação de nove meses, repleta de modificações hormonais e estruturais para gerar um bebê, e espera-se que em quatro dias seu corpo já tenha voltado ao normal? De verdade?

Indignação número 2: gordinha??? Onde???

Mas já era de se esperar comentários desse tipo. A indústria da dieta é tão perspicaz que é capaz de convencer mulheres que o principal benefício da amamentação é gastar calorias, e não estabelecer um vínculo forte e saudável com seu filho; é capaz de fazer as novas mamães acreditarem na promessa de que não importa o quão modificada e confusa vai se tornar a vida delas a partir de agora; não importa o quão sobrecarregadas e desconectadas do seu próprio corpo elas se sentirão: tudo será resolvido se pelo menos elas puderem "consertar" seus corpos.

Precisamos ter em mente que nosso corpo é um reflexo das nossas vivências, e que saber respeitá-lo é saber entender e aceitar nossa história de vida.

Precisamos refletir se nossos pensamentos a respeito de corpo e peso estão ocupando boa parte do nosso tempo e se estão mobilizando boa parte de nossos esforços. Afinal, existem coisas maiores e mais importantes.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

Não comprem cookies dos escoteiros!


O tradicional grupo dos escoteiros americanos, conhecidos por pregar os valores de “boa conduta, respeito pelos demais e honestidade” (esse texto foi retirado do site oficial do Boy Scouts of America), acabou de se contradizer ao discriminar crianças obesas. Isso porque eles impediram aquelas com IMC acima de 40kg/m² a participarem de um acampamento nacional que começou hoje, chamado de Jamboree. Ou seja: não importa se seu filho joga futebol, faz parte do time de luta e natação da escola, e se nos últimos dois meses ele caminhou todos os dias por duas horas carregando uma mochila de 20kg para aumentar seu condicionamento (depoimento de uma mãe americana sobre seu filho obeso, que se candidatou ao acampamento); se a criança é gorda, isso define suas oportunidades dentro do grupo dos escoteiros.

Já foi demonstrado num outro post (e também nesta revisão científica) os diversos malefícios à saúde gerados pelo estigma e preconceito da obesidade: depressão, ansiedade, insatisfação corporal, tendências suicidas, comportamentos alimentares transtornados... Agora, imaginem o que significa para uma criança ser excluída de uma atividade em grupo (e sofrer bullying, claro) simplesmente por ser gorda. Qual a dimensão que isso vai assumir em sua vida? Será que ela vai ter uma relação saudável com seu peso e com seu corpo depois disso? Acho difícil.

Portanto, escoteiros: não venham bater na minha porta. Não vou comprar cookies de vocês.

sábado, 13 de julho de 2013

Participante de reality show é processada por ganhar peso


A americana Tara Costa, ex-participante do reality show "The Biggest Loser", está sendo processada por ter ganhado 20 dos 70kg que ela perdeu em 2009 no programa. Para quem não sabe, neste programa alguns obesos ficam confinados numa casa e passam o dia todo fazendo exercício, comendo pouco e se engajando em mil loucuras para ver quem perde mais peso, precipitando inclusive casos de transtorno alimentar.

A empresa "FC Online Marketing", de quem Tara é garota-propaganda, alega que a moça desrespeitou a cláusula que diz que ela teria que manter seu nível de fitness e condicionamento durante a vigência do contrato.

Existem dois problemas nisso tudo:

1. Ter condicionamento físico e manter um certo grau de fitness independe de peso. Prova disso são os estudos com obesos metabolicamente saudáveis (veja aqui) e a existência de atletas olímpicos gordos (veja aqui).

2. Já é mais do que comprovado pela ciência que perder muito peso, de forma rápida, e sem adotar mudanças de estilo de vida sustentáveis é garantia certa de reganho de peso, graças às mudanças fisiológicas e psicológicas que ocorrem em nosso corpo diante dessas situações: maior liberação dos hormônios de fome, maior salivação, maior síntese de gordura pelas nossas células de armazenamento (adipócitos), pensamentos obsessivos sobre comida... (vejam este estudo super interessante sobre o tema).

Ahh, os americanos e sua "queda" por processos incabíveis...

segunda-feira, 1 de julho de 2013

“Eu sou uma porca gorda”



“Eu sou uma porca gorda”. “Minha barriga tem tantas dobras que eu poderia esconder criancinhas nelas”. Infelizmente, é comum na minha prática ouvir pacientes (especialmente mulheres) tratando seus corpos com desprezo ou até mesmo de forma pejorativa, usando por exemplo as frases acima. Apesar de fofa a imagem do animalzinho, minhas pacientes em nada se parecem com ele.

Esse tipo de linguajar usado para ofender seu próprio corpo ou o corpo das outras pessoas é chamado em inglês de fat talk, apesar de muitas vezes não se relacionar só com gordura (um paciente homem já disse por exemplo: "estou tão 'frango' que pareço um aidético", referindo-se ao seu descontentamento com o volume de massa muscular em seu corpo). E o fat talk é extremamente perigoso, apesar de parecer para alguns inofensivo ou até mesmo engraçado.

Em primeiro lugar, é perigoso porque quanto mais você se agride, mais aumenta sua insatisfação corporal (isto é comprovado inclusive por estudos). E quanto mais insatisfeito você está consigo mesmo, menor a probabilidade de você se engajar em seu autocuidado (veja aqui). Além disso, fat talk é como um dominó: você começa se denegrindo, a pessoa ao seu lado vai começar a se denegrir também (“você, gorda suja? E a minha barriga então!”) e logo menos vocês estarão “brigando” para ver quem se odeia mais.

Em segundo lugar, é perigoso porque focar-se nos aspectos negativos de seu corpo normalmente funciona como uma distração de outros aspectos de sua vida que não estão te agradando, ou mesmo como uma fuga de sentimentos difíceis. E se você não se focar no que de fato está te incomodando (seu emprego é um saco, você se sente carente, um amigo querido mudou de cidade), você não será capaz de enfrentar a situação e se sentir melhor.

Portanto, aí vai uma sugestão: tente se tratar com mais respeito! Você é muito mais do que sua aparência! Pense no que você diria sobre si mesmo caso fosse proibido falar sobre seu corpo. O que você tem a oferecer de positivo?


Boa semana a todos!

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Enfatizar controle de peso em jovens com excesso de peso é prejudicial

Já escrevi aqui que mães de filhos obesos tendem a incentivar mais a prática de dietas, que é um fator de risco independente para transtornos alimentares e que pode levar à obesidade ao longo dos anos. Um estudo recente publicado na revista científica JAMA Pediatrics confirmou este dado: jovens com excesso de peso cujos pais falavam constantemente sobre peso apresentaram maiores prevalências de prática de dietas e comportamentos não saudáveis de controle de peso do que jovens cujos familiares conversavam somente sobre alimentação saudável (53,4% x 40,1% para prática de dietas e 53,2% x 40,6% para comportamentos não saudáveis de controle de peso, como pular refeições, usar diuréticos e laxantes). A amostra consistiu em mais de 2000 adolescentes e mais de 3000 pais, participantes do grande estudo Eating and Activity in Teens 2010 (EAT 2010), coordenado pela renomada pesquisadora Dianne Neumark-Sztainer.

Ou seja: não importa o peso do seu filho, enfatizar controle de peso só aumenta a probabilidade dele fazer dieta (que não é nada bom!) e usar métodos inadequados para controlar seu peso, como vomitar, usar laxantes e fazer jejuns!

Ao invés disso, procure conversar sobre alimentação saudável no sentido amplo do conceito, colocando que todos os alimentos podem ser consumidos com moderação e prazer!

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Se você fosse morrer hoje, qual seria sua última refeição?



Brian Wansink, autor do livro “Mindless Eating” (fortemente recomendo!) e de diversas pesquisas curiosas que avaliam as razões inconscientes e automáticas pelas quais escolhemos determinados tipos de alimentos, publicou um estudo muito interessante sobre o conteúdo alimentar da última refeição de presos americanos no corredor da morte. O objetivo foi tentar investigar como as pessoas se relacionam com a comida em situações altamente estressantes do ponto de vista emocional (não imagino nada mais estressante do que saber que em algumas horas estarei morta!). Sabe-se que muitas pessoas em situações financeiras desfavoráveis, por exemplo, tendem a ter o pensamento de “aproveitar o presente, já que o futuro é incerto”. Alguns estudos inclusive apontam que este seria um fator relacionado ao aumento da obesidade em camadas sociais mais pobres.

Os pesquisadores analisaram a última refeição de 193 presos que foram executados entre 2002 e 2006 nos EUA. Eles encontraram que o valor calórico médio das refeições era de 2756kcal, sendo que algumas refeições chegaram a 7200kcal! Além disso, as refeições eram normalmente ricas em proteínas (em especial carnes de maneira geral) e carboidratos (em especial açúcar branco, sacarose, na forma de sobremesas) e pobres em vegetais e frutas. Ainda assim, 26,9% dos presos pediram por “salada” na forma de acompanhamento.

Outra observação curiosa é que dos 66% que pediram sobremesa, a maioria pediu mais de um ítem (torta e sorvete, por exemplo). Chocolate não apareceu nenhuma vez, a não ser como um modificador (exs: bolo de chocolate, leite com chocolate, mas nunca só o chocolate).

Os autores discutem que a escolha de comidas ricas em calorias, carboidratos e açúcares podem refletir a preferência alimentar dos presos mas também a necessidade por conforto e acolhimento numa situação altamente estressante e desoladora. Não foi a toa, por exemplo, que 40% dos indivíduos escolheram alimentos de marcas específicas e conhecidas. Ou seja, seu estudo é mais uma evidência de que ambientes e situações desfavoráveis e emocionalmente desconfortáveis podem levar ao exagero alimentar.

Mas na minha opinião, o que ele coloca de mais importante, é o seguinte questionamento: será que profissionais/campanhas antiobesidade promovem algo de positivo quando “assustam” as pessoas com as consequências negativas da obesidade? Ou será que, assim como nas campanhas de cigarro com aquelas imagens ameaçadoras, isso gera tamanha ansiedade que faz com que as pessoas consumam/comam mais?

Boa reflexão a todos!

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Campanhas “antiobesidade” manipulam imagens de crianças

Todos sabemos que as imagens veiculadas pela mídia atualmente estão completamente modificadas por Photoshop. Mas as imagens não são editadas somente para deixar as pessoas mais magras: elas podem se tornar mais gordas também.

Uma agência governamental americana criou uma campanha “antiobesidade” mostrando a imagem de uma criança gorda tomando um pacote de açúcar, alegando que é isso mesmo que acontece quando se toma sucos industrializados e refrigerantes. O espantoso é que eles usaram como base a fotografia de uma criança com peso aparentemente normal, modificando-a com o Photoshop. Como se só as crianças com excesso de peso tomassem sucos e refrigerantes...



Esse tipo de estratégia para chocar os consumidores já foi usado em muitas campanhas “antiobesidade”. Coloco entre aspas pelo seguinte motivo: usar imagens estereotipando os obesos contribui ainda mais com a estigmatização de quem está acima do peso e não ajuda em nada na promoção de mudanças de comportamento (este estudo demonstra isso de forma muito clara). Ou seja: fazer os gordos se sentirem mal, por meio de campanhas retratando de forma negativa pessoas obesas, NÃO fará com que eles adotem comportamentos mais saudáveis. Ponto final.

Se esse tipo de campanha funcionasse (veja mais um exemplo abaixo, de um homem que aparece com a perna “amputada” pelo Photoshop), os índices de obesidade não estariam crescendo...

quarta-feira, 29 de maio de 2013

Fotógrafa obesa retrata reações preconceituosas contra si mesma

Já se falou nesse blog sobre o estigma ou preconceito da obesidade, ou seja, a ideia compartilhada por muitas pessoas de que obesos são preguiçosos, menos capazes, não têm vergonha na cara e por isso continuam gordos... (leia aqui, aqui e aqui). Além disso (e muitas vezes por conta disso), é comum as pessoas gordas despertarem olhares e reações negativos e julgadores por parte dos demais. Foi justamente isto que a fotógrafa americana Haley Morris-Cafiero retratou em seu projeto “Wait Watchers”, um trocadilho com “Weight Watchers”, que o grupo de Vigilantes do Peso.

As fotos eram tiradas da seguinte maneira: ela se posicionava em diversos lugares públicos ao redor do mundo – como a Times Square, em Nova Iorque – fazendo atividades cotidianas como amarrar os sapatos, procurar locais em um mapa, mandar mensagens de um celular... Enquanto isso, um assistente ficava próximo e tirava fotos aleatórias enquanto outras pessoas iam passando. Em várias fotos, a fotógrafa identificou pessoas olhando para ela com ar de deboche ou mesmo tirando um sarro enquanto ela não estava vendo.





Claro que muitas pessoas passaram e simplesmente não prestaram atenção, mas o fato de haver fotos comprometedoras, por assim dizer, nos dá um alerta de que o estigma/preconceito da obesidade está internalizado na sociedade. Será que nós mesmos já não olhamos para um obeso da mesma forma que as pessoas retratadas nas fotos?

Bom feriado a todos!

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Aspectos éticos e sociais podem influenciar comportamento alimentar de universitários


(Tradução: "Qual entrada levanta menos questões éticas?")

Tem sido bastante discutido atualmente que os aspectos médicos e nutricionais da alimentação parecem ser pobres motivadores à mudança de comportamentos alimentares. Ou seja, muitas pessoas já sabem o que “faz bem” e o que “faz mal”, mas as escolhas alimentares permanecem as mesmas. Neste sentido, um estudo interessante publicado em 2010 avaliou a eficácia de um curso focado nos aspectos éticos, sociais, culturais e ambientais da alimentação sobre o comportamento alimentar de jovens universitários.

A pesquisa realizada nos EUA contou com 100 universitários divididos em dois grupos: 28 participaram do curso descrito acima (“Food and Society”) e 72 participaram de outros cursos relacionados com saúde (“Health Psychology”, “Community Health” e “Obesity: Clinical Implications”). O primeiro curso era totalmente voltado às questões sociais, éticas e ambientais relacionadas à alimentação, e o material de estudo e discussão englobava livros e filmes famosos como “O dilema do onívoro”, “Mindless eating”, “Food politics” e “Super size me” (inclusive, leiam e assistam, vale a pena!). Os estudantes preencheram um questionário de frequência alimentar no início e no final do estudo (após três meses de curso).

Os resultados foram interessantíssimos: os alunos do curso “Food and Society” melhoraram significativamente o consumo de vegetais e houve redução quase significativas no consumo de doces e carnes com alto teor de gordura. Já os alunos que assistiram aos demais cursos não apresentaram melhoras e ainda por cima reduziram de forma significativa o consumo de vegetais. Ou seja, esta pesquisa concluiu que aspectos sociais relacionados à alimentação parecem motivar mais o processo de mudança de comportamento alimentar do que questões relacionadas à saúde.

quarta-feira, 15 de maio de 2013

Novo avanço no tratamento do diabetes



Um novo hormônio isolado por pesquisadores de Harvard pode ser a nova promessa para o tratamento do diabetes tipo 2 (e também tipo 1). Seu nome é betatrophin (talvez seja traduzido para o português como "betatrofina") e sua descoberta foi divulgada na revista científica Cell deste mês.

Seu mecanismo de ação, como o próprio nome evoca, consiste no aumento da proliferação de células beta, células do pâncreas responsáveis por produzir e secretar insulina. Esse efeito por enquanto só foi visualizado em ratos. Segundo os autores da pesquisa, se os resultados forem semelhantes em humanos (ensaios clínicos prometidos para daqui 5 anos) e se um medicamento for produzido a partir desta substância, isso poderia significar que pacientes com diabetes precisariam somente de uma injeção por mês de "betatrofina", ao contrário das múltiplas injeções diárias de insulina.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Companhia americana cria loja de roupas especializada para homens obesos


Foto da campanha publicitária da companhia “Destination XL”, que apresenta em suas propagandas televisivas atores obesos

Aproveitando o fato de que aproximadamente 3 em cada 4 homens adultos nos EUA estão acima do peso, a companhia “Destination XL” começou a divulgar essa semana a abertura de uma rede de lojas especializada em roupas plus-size para homens. Além das próprias roupas, as lojas apresentam outros atrativos para o público masculino obeso: têm corredores mais largos, provadores maiores, água mineral engarrafada gratuita, alfaiates à disposição e as televisões sintonizadas em canais com programação esportiva ou do mercado financeiro.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

“Se eu sei o que preciso fazer para emagrecer, por que não faço?”



Muitos pacientes me trazem esse questionamento depois de algumas consultas, quando parece que o tratamento “empaca” e mudanças comportamentais não conseguem ser feitas. A resposta nem sempre é fácil, mas percebo que muitas vezes a inércia de mudar tem a ver com algo simples: não se sentir merecedor. Vou tentar explicar melhor.

A maioria das pessoas já sabe que para melhorar a alimentação e tornar a vida mais saudável é preciso tomar café da manhã, comer frutas e legumes todos os dias, beber mais água, fazer algum exercício físico regularmente... E isso parece simples, não? Mas tais atitudes fazem parte do nosso autocuidado. E muita gente confunde autocuidado com autoindulgência ou mesmo “perda de tempo”. Percebo que muitos dos meus pacientes não tendem a encarar o autocuidado como prioridade, e não só em relação à alimentação, mas em relação também a outros comportamentos que promovem bem-estar: ler um livro, cultivar a espiritualidade e as amizades, ter um momento de lazer/distração no dia, vestir roupas que te deixem mais bonito/a...

São comuns pensamentos do tipo: “por que vou começar a fazer exercício? Por que deixar de comer fritura todos os dias? Já estou gordo mesmo”... Mas já foi dito aqui algumas vezes: se você não se respeita e aprecia as coisas positivas do seu corpo, se você não se gosta minimamente, realmente vai ser difícil cuidar melhor de si. E isso envolve comer de forma mais saudável e até mesmo emagrecer, por mais paradoxal que isso possa soar.

Sugiro a leitura desse belo texto sobre o mesmo tema, escrito pela amiga e colega de profissão Iamara Medeiros.

Bom feriado a todos!

sexta-feira, 26 de abril de 2013

Mais notícias do mundo da moda

Uma boa e uma má (na verdade assustadora!) notícia em relação às atitudes do mundo da moda com os transtornos alimentares:

Boa: a agência de modelos Star Models lançou uma campanha recentemente declarando-se contra o padrão ultra-magro das modelos. Nas peças publicitárias da campanha, aparece a frase “you’re not a sketch, say no to anorexia” (“você não é um croqui, diga não à anorexia”). A notícia veio bem a tempo de amenizar o fato bombástico divulgado pela ex-editora da Vogue Austrália, que lançou um livro contando que modelos comem lenços de papel para “não sentirem fome” e emagrecerem.







Má: agências suecas de modelos estão “rondando” clínicas especializadas no tratamento de transtornos alimentares a fim de encontrarem “novos talentos”, ou seja, as próprias pacientes com anorexia nervosa, que estão buscando ajuda para recuperar peso e adotar uma relação mais saudável consigo mesmo e com a comida. Que vergonha.

domingo, 21 de abril de 2013

Prevenção de obesidade em escolas pode incentivar transtornos alimentares



É comum atualmente no mundo a criação de programas de prevenção de obesidade nas escolas, focando em incentivos para diminuir o consumo calórico e aumentar o gasto energético por meio de atividade física. O objetivo desses programas é fazer as crianças perderem peso e/ou atingirem um “peso saudável”, e é frequente a adoção de pesagens periódicas para se avaliar o “progresso” obtido.

Entretanto, um estudo americano recente questiona esse tipo de programa, já que não foca em questões como autoestima, estima corporal, ditadura e mito da beleza e comportamentos inadequados para perda/manutenção de peso. E o motivo do questionamento é simples: pessoas predispostas a desenvolverem transtornos alimentares podem interpretar informações sobre alimentação e peso saudáveis de formas extremas, especialmente adolescentes que estão passando por mudanças corporais notáveis. Isso resultaria no surgimento dos transtornos alimentares. E o interessante é o seguinte: este estudo descreve quatro casos de adolescentes americanos (13 e 14 anos, 3 garotas e 1 garoto) que desenvolveram a doença logo após a exposição a programas de prevenção de obesidade em suas escolas. Ou seja: eles relatam que a preocupação com peso e comida só surgiu devido a esses programas.

Outro ponto relevante colocado pela pesquisa: não existem estudos que demonstrem o impacto desses programas na saúde mental das crianças e adolescentes e que confirmem a eficácia das estratégias propostas na perda e manutenção de peso a longo prazo!

É claro que precisamos de programas que abordem a prevenção da obesidade em crianças e adolescentes, mas o que estudos atuais vêm apontando é que estes deveriam propor estratégias de prevenção conjunta de obesidade e transtornos alimentares e focar em comportamentos saudáveis ao invés de "peso saudável" (veja aqui e aqui).

Isso é possível? Com certeza! Inclusive, já deixo aqui o convite: dia 29/6, em São Paulo, o Genta (Grupo Especializado em Nutrição e Transtornos Alimentares, do qual faço parte) fará um evento justamente sobre essa temática. Mais informações em breve!

sábado, 13 de abril de 2013

Associação Dietética Americana endossa livro de dieta



A figura acima é a capa de mais um livro de dietas lançado há pouco tempo nos Estados Unidos. O título é autoexplicativo: “The Game On! Diet: kick your friend’s butt while shrinking your own” (algo como “A Dieta Game On!: chute a bunda de seu amigo enquanto encolhe a sua própria”). Ou seja, o livro incentiva que você e seus amigos formem times e iniciem uma competição para ver qual se torna “mais saudável”.

A proposta de “saudável” que o livro oferece envolve o seguinte (daí vocês entenderão a necessidade das aspas!):

1. Comer cinco pequenas refeições ao dia (sim, as porções de fato são bem reduzidas!), intercaladas se necessário por “aperitivos de pepino e aipo”;

2. As refeições devem ser compostas por cereais integrais, proteína magra, gorduras saudáveis e vegetais frescos;

3. As refeições não podem conter alimentos da categoria “fat-loading” e “belly-bloating” (basicamente, os “engordativos”): alimentos fritos, carnes processadas e/ou com elevado teor de gordura, qualquer coisa produzida com farinha branca e açúcar (ou seja, basicamente tudo!), margarina e manteiga, queijos gordurosos, frutas secas e inclusive suco de frutas! Atenção: esses alimentos só podem ser consumidos (e olhe lá!) na sua cota diária de 100 calorias livres (ou seja, coma o que quiser uma vez ao dia até 100 calorias) ou no seu “day-off” (ou seja, naquele dia livre em que aparentemente você terá uma compulsão alimentar);

4. Os alimentos devem ser preferencialmente orgânicos e você deve excluir tudo que contenha adoçantes artificiais;

5. O consumo de cafeína deve ser limitado, por isso os autores eliminam refrigerantes. Entretanto, café e chás (que muitas vezes são ricos em cafeína) são permitidos...

Mas por que resolvi escrever um post voltado para mais um livro de dietas, nada diferente de todos que já existem? Cujas propostas certamente não promovem adesão a mudanças de comportamentos saudáveis a longo prazo, justamente por não serem viáveis? Aí é que está o mais preocupante: a “Academy of Nutrition and Dietetics” (“Academia de Nutrição e Dietética”, antiga “Associação Dietética Americana”), órgão norte-americano que supostamente deveria defender e valorizar a ciência da nutrição e os nutricionistas, ENDOSSA AS ORIENTAÇÕES DESTE LIVRO! Ela coloca em seu documento oficial: “acreditamos que esse livro pode encorajar e motivar o leitor a se tornar mais saudável.” Ainda assim, eles sugerem que os indivíduos trabalhem em conjunto com um nutricionista ao longo da leitura... Ora, se a pessoa vai ao nutricionista ela não precisa ler este livro!

Alguns profissionais de renome nos EUA já estão se mobilizando para mandar um documento à Academia solicitando a retirada deste posicionamento do site oficial do órgão. Trago mais novidades a respeito em breve.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Múmias já tinham aterosclerose



Um estudo publicado agora em março na prestigiada revista científica “Lancet” encontrou resultados surpreendentes: múmias de 4.000 anos já tinham aterosclerose!

O autor da pesquisa avaliou via tomografia computadorizada 137 múmias de 4 regiões diferentes do planeta e que apresentavam diferentes culturas, estilos de vida e hábitos alimentares. Foi encontrada a presença de aterosclerose em mais de um terço da amostra, o que sugere que o corpo humano tenha uma predisposição natural para o desenvolvimento da doença. Além disso, o autor coloca que as múmias viveram numa época em que as causas de morte mais comuns eram as infecções, que poderiam promover estado inflamatório e com isso contribuir com a instalação da aterosclerose.

sábado, 23 de março de 2013

Pacientes confiam menos em profissionais de saúde com excesso de peso



A figura acima ilustra bem o tema de hoje. Já escrevi aqui sobre o preconceito de profissionais de saúde contra pessoas obesas e o impacto negativo que isso gera no cuidado destes pacientes. Entretanto, um estudo fresquinho publicado no “International Journal of Obesity” mostra que o inverso também é verdadeiro: existe preconceito por parte dos pacientes contra profissionais de saúde que estão acima do peso.

O estudo feito com 358 adultos encontrou que os participantes confiavam menos em profissionais com sobrepeso e obesidade, estavam menos propensos a seguirem suas orientações e estavam mais inclinados a mudarem de profissional. O interessante é que o preconceito encontrado foi o mesmo em participantes que também estavam acima do peso. Ou seja, nem quem é gordo quer ser tratado por outro gordo.

Não vou nem entrar no mérito aqui da pressão pela magreza que nós nutricionistas sofremos. Acredito que em nossa classe profissional a exigência pela magreza é bem maior do que na classe de médicos, fisioterapeutas, enfermeiros... Afinal, “como confiar em um nutricionista que é gordo? Se ele é gordo não deve saber o que está fazendo!”

A questão é que a competência profissional de NINGUÉM pode ser medida pelo número que sai na balança. Conheço muitos profissionais excelentes e que são gordos. Inclusive nutricionistas! Hoje em dia já se sabe que emagrecer é muito mais do que simplesmente comer “certo” e se exercitar, a gênese da obesidade é multifatorial e envolve aspectos políticos, sociais, ambientais, psicológicos...

Já ouvi pessoas dizendo que para se acabar com esse tipo de preconceito é “simples”, basta obrigar mesmo os profissionais a emagrecerem. Considero isso um absurdo. Então, para reduzir o preconceito racial vamos “obrigar” as pessoas a trocarem a cor da sua pele?! Vamos “obrigar” os homossexuais a mudarem sua inclinação sexual?! Nunca vi reduzir o preconceito por meio da exclusão. Eu acredito no respeito mútuo e na aceitação. Aceitação de que as pessoas tem a liberdade de decidir individualmente sobre como cuidar de seu corpo e o que fazer com ele.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Cirurgia bariátrica não reduz custos com saúde a longo prazo

É comum hoje em dia você ouvir profissionais de saúde defendendo a cirurgia bariátrica a torto e a direito porque “é o único tratamento realmente eficaz para a obesidade, vai reduzir os custos com saúde que a pessoa vai ter no futuro caso ela não se submeta ao procedimento”. Entretanto, um estudo recente e muito bem conduzido demonstrou que não é bem por aí. A cirurgia bariátrica parece não gerar economia com cuidados de saúde a longo prazo.

Neste estudo, que revisou cerca de 30.000 casos, compararam-se indivíduos obesos que fizeram algum tipo de cirurgia bariátrica com obesos que não realizaram o procedimento. Para o primeiro grupo, os custos com saúde no primeiro ano após a operação foram quase US$ 1.000,00 menores. Entretanto, nos dois anos subsequentes, os custos para os operados foram significativamente mais elevados.

Claro, não podemos esquecer que a cirurgia, quando bem indicada, traz uma série de benefícios à saúde, à qualidade de vida... Mas precisamos estar atentos para não passar adiante uma informação que não corresponde à realidade.