segunda-feira, 7 de julho de 2014

Em paz com o corpo


O texto de hoje foi retirado da edição de julho/2014 da revista Vida Simples. Foi escrito por Lucas Tauil de Freitas. Mostra uma outra maneira de visualizarmos e vivenciarmos o corpo, com base em sua funcionalidade e nos detalhes (por vezes banais) que trazem significado para nossas vidas.

Boa semana!

"Cresci um menino capacete. Apesar da infância no interior, vivia dentro de casa, assistia TV demais e me movimentava pouco, bem pouco. Foi já moço que fiz as pazes com o corpo. Descobri meu caminhar no grupo de teatro da faculdade. Ainda me divirto ao lembrar da cara de surpresa com que ouvi que não sabia andar. Depois vieram os ensinamentos de como respirar por meio da ioga. A prática foi um encontro com o fluxo e o movimento consciente. A libertação da vaidade e da patrulha estética demorou mais, mas veio também. Porém, foi o mar que selou meu amor com a pele que me comporta. Encontro dos ambientes dos meus sonhos.

Braços fortes que puxam cabos e sobem as velas que nos impulsionam. Mãos hábeis que amassam nosso pão e remam para as praias do nosso caminho, que agarram a corrente que nos mantêm seguros na ancoragem. Dedos precisos que tecem e consertam de tudo. Pernas que me levam de lá para cá, que me permitem a alegria de deslizar sobre uma onda. Peito largo que me dá a plenitude do abraço de minhas filhas, que acolhe minha companheira nas noites frias.

Sentidos meus, lapidados na natureza. Olhos que se aguçam no horizonte amplo do oceano e nos movimentos focados da ioga. Ouvidos que despertam para o silêncio e também para os sons ritmados do navegar. Pele que sente o vento. Paladar que se perde em beijos lentos, e também encontra os sabores estrangeiros e picantes na estrada. Cheiro de sal e desejo, faro fiel que me guia pacato, imperceptível. Respirar que silencia minha mente inquieta. Sentido outro que me faz ver além da carne, que desdobra o sólido em milagre.

Frágil e mágico, corpo que é minha ponte para este mundo. Igreja onde vive o divino em mim. Meu corpo amigo, que todas as manhãs hidrato com lentos copos de água e estico em dedicadas posturas de ioga. Eu físico que senta em silêncio, que escuta e não pede. Minha carne nutrida com alimentos que me fazem bem e pensamentos serenos, fundação da minha alma e dos meus mais variados desejos. Corpo que é o veículo da minha expressão, ferramenta e matéria-prima da minha arte. Caminho do meu querer.

Presença minha na comunidade. Mãos que não apenas oram, mas cuidam de mim mesmo e do outro.

Meu habitat que não é tudo o que sou, mas é portal da minha alma, carregador de meus olhos. Meu corpo que encontra outro corpo, canal do encontro dos nossos seres. Viva a carne, viva a pele, viva a alma."

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